terça-feira, 12 de outubro de 2010

Estado vai tributar subsídio de renda de casa a magistrados

É verdade que o título é sensacionalista: na realidade o subsídio já é atribuido, mas o que muda é que agora vai ser considerado parte do rendimento, o que implicará que seja taxado pelo IRS. O mais curioso é que este subsídio não olha ao número de pessoas do agregado que o recebem, nem mesmo ao facto de haver deslocação geográfica ou não, de quem o recebe.

Juízes e procuradores vão ter um corte de ordenados de 10%, mas poderão subir no escalão de IRS porque o subsídio de renda de casa vai passar a ser considerado rendimento.

O Governo vai cortar 10% no vencimento dos juízes e magistrados do Ministério Público, mas também quer que o montante de cerca de 700 euros que mensalmente recebem de subsídio de renda de casa passe a ser considerado rendimento, devendo ser chamados à colecta no final do ano para apuramento do IRS. Alguns correm agora o risco de subir no escalão dos impostos, embora percam rendimentos reais. Revoltados com as propostas, os procuradores admitem participar na greve geral do dia 24 de Novembro. Os juízes ainda não discutiram o assunto.

Estas medidas foram ontem de manhã comunicadas aos sindicatos dos juízes e procuradores, no âmbito do PEC III. À tarde, os dirigentes discutiram-nas separadamente no Ministério da Justiça (MJ), estando o Governo representado pelo secretário de Estado da Justiça, José Magalhães, e pelo secretário de Estado da Administração Pública, Gonçalo Castilho dos Santos. Amanhã , os juízes regressam para um novo encontro.

O corte de 10% nos vencimentos poderá significar 250 euros mensais para um magistrado no início de carreira ou cerca de 600 euros para quem já chegou ao topo. Esta perda de rendimento deveria reflectir-se numa menor tributação de IRS ao final do ano por parte do fisco. Eventualmente, alguns dos magistrados poderiam, inclusive, descer de escalão.

Mas, no que diz respeito a esta classe profissional, o cenário deverá ser ao contrário. A taxa de tributação de IRS deverá aumentar porque o Governo quer que o subsídio mensal de renda de casa, que ronda os 700 euros, passe a ser também considerado rendimento e, como tal, deva ser chamado à colecta. Assim, alguns daqueles profissionais correm ainda o risco de subir no escalão dos impostos, uma vez que são acrescentados 8400 euros aos seus rendimentos anuais. Juízes e procuradores vêem assim aumentados os seus rendimentos para efeito de IRS, quando, na realidade, eles sofrem um corte de 10%.

João Palma, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), estava visivelmente desgastado ontem ao final da reunião no MJ.

"Esta proposta viola claramente princípios constitucionais", disse ao DN. E enumerou alguns: "Nomeadamente , a intangibilidade das remunerações, da igualdade, da confiança." E acrescentou: "A proposta não está estruturada com critérios justos e equitativos, nem é sensível ao facto de os magistrados serem obrigados a exercerem a sua actividade em regime de exclusividade."

Para João Palma, "não fossem os cargos inúteis e injustificados - alguns pagos principescamente, com todo o tipo de remunerações complementares, despesas de representação, e outras - existentes no Estado, não estaríamos hoje confrontados com a necessidade de reduzir vencimentos a pessoas que exercem funções cruciais, como são os magistrados, os professores, os médicos".

O presidente do SMMP alertou também para o risco de a justiça entrar em colapso com a não admissão de 800 funcionários judiciais, e o congelamento da entrada de novos magistrados pela via de um concursos especial que já estava previsto.

A participação na greve geral de 24 de Novembro é uma hipótese que o sindicato pondera. "Vamos convocar uma assembleia geral para decidir", informou.

Sob as mesmas medidas estão também os magistrados judiciais. Os representantes da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) estiveram ontem reunidos no Ministério da Justiça, mas o encontro terá sido inconclusivo. Um novo encontro já está agendado para amanhã. Só depois é que o organismo sindical deverá comentar os cortes anunciados, nomeadamente a tributação do subsídio da renda de casa.

in Diário de Notícias online, 12 de Outubro de 2010
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