Ao fim do primeiro ano de aplicação do QREN, Lisboa captou fundos comunitários ao abrigo do regime do chamado "efeito difusor" no valor de 193 milhões de euros, dos quais 148 serão contabilizados como se tivessem sido investidos no Norte, Centro e Alentejo.
Além disso, e já que os fundos só cobrem parte do investimento, o Orçamento de Estado é chamado a cobrir a parte restante. De acordo com o Observatório do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), o valor total do investimento propiciado pelo uso do "efeito difusor" ascende a 418 milhões de euros.
Este efeito, também chamado de "spill over", foi negociado entre o primeiro Governon de José Sócrates e a Comissão Europeia e diz que uma parte dos fundos comunitários dados pela União especificamente para desenvolver as três regiões mais pobres do país - Norte, Centro e Sul - pode ser aplicada em Lisboa, sob o argumento de que certos investimentos lá realizados têm efeitos benéficos sobre o resto do país. Em causa estão, sobretudo, gastos com a modernização da Administração Pública.
No final de 2009, o montante investido em Lisboa com recurso à cláusula de excepção representava 0,2% da verba aprovada no Programa Operacional Potencial Humano, para formação profissional (neste caso, de funcionários públicos). Mas, no segundo Programa Operacional em que se aplica - o de Factores de Competitividade, sobretudo no que toca à modernização da Administração Pública -, o valor ascendia a 8,8% do total aprovado. Esta percentagem é "bastante significativa" e "deveria diminuir", considera Mário Rui Silva, gestor do fundo comunitário específico da região Norte (PO Norte).
O responsável pensa que o dinheiro das regiões investido em Lisboa está "no limite dos limites", mas escusou-se a dizer quanto seria adequado. Reafirmou, antes, o princípio que, entende, deve ser seguido: "Os fundos são dados para induzir mudança estrutural nas três regiões de convergência, pelo que os recursos devem ser afectados a essas regiões".
É essa a tese defendida pela junta Metropolitana do Porto na queixa apresentada em Bruxelas e nos processos a decorrer no Tribunal Administrativo do Porto, adiantou o advogado Luís Paiva Brandão. A queixa foi entregue à Comissão Europeia em Outubro de 2008. "Até agora ainda não tivemos resposta", afirmou.
Desvio deve-se a centralismo
Enquanto decorrem os processos judiciais, o Governo vai apresentando candidaturas a fundos comunitários. Mário Rui Silva reconhece a vantagem de os valores investidos em Lisboa com verbas das regiões mais pobres serem agora do domínio público, ao contrário do sucedido em quadros anteriores. "Podemos agora ir monitorizando o que se passa", disse.
Espera, assim, que os próximos relatórios não demonstrem um aumento face à fatia das verbas que já foi desviada para Lisboa. "O cenário mais optimista é que este valor reflecte o essencial dos projectos e que a maioria das medidas já tenha sido lançada", disse.
Mário Rui Silva reconhece que a decisão de financiar a modernização da administração pública com fundos das regiões mais pobres, em vez de o fazer através do Orçamento de Estado, é política e decorre do facto de a Administração Central estar "toda ela sediada em Lisboa". Daí referir que o "desequilíbrio" actual entre Lisboa e o resto do país só se resolve criando regiões com autonomia.
in JN, dia 15 de Fevereiro de 2010